Simplicidade é um conceito difícil. O dicionário Houaiss fornece mais de 15 significados para a alavra "simples". O que, logo de cara, mostra que definir a questão da simplicidade pode ser algo complexo.
Atualmente há uma inclinação forte para o simples. A arquitetura deve ser simples. A educação deve ser simples. A política deve ser simples. A jogada deve ser simples. O plano de negócios deve ser simples. O sistema deve ser simples. A arte deve ser simples. Enfim, o mundo deve ser simples.
E, pensando assim, logo caímos num paradoxo: como fazer coisas complexas com simplicidade? Porque, afinal, coisas complexas existem e são necessárias. Por exemplo, um sistema operacional é o software mais complexo que existe. A produção de um filme é algo complexo. Construir um estádio de futebol também é. E a economia, então, nem se fala.
Talvez o problema seja que nós estamos muito acostumados a lidar com os significados de números 9 e 10 contidos no Houaiss para o verbete "simples":
9- que não é sofisticado; modesto, singelo; habitual, comum
10- sem luxo, sem ostentação; singelo, modesto
Tentando criar sem sofisticação e com modéstia, ficamos presos a algumas possibilidades apenas. E então não saímos do lugar. O paradoxo nos vence.
Mas é aí que entram os signficados de 1 a 6:
1- que não é composto, múltiplo ou desdobrado em partes
2- que é feito de um elemento básico, que não se compõe de partes ou substâncias diferentes; singelo
3- que evita ornamentos dispensáveis ou afetação
4- desprovido de elementos acessórios
5- que é elementar, não apresentando qualquer embaraço para sua compreensão
6- isento de significações secundárias; mero, puro
O simples agora parece estar ligado a uma questão de importância. Simples é o que é indispensável, o que está no centro da questão. Mas, peraí, e aquilo ali de não ser composto? Desse jeito ficamos só com as partículas elementares: bosons e fermions (se bem que elas não são fáceis de compreender, então talvez contrariem a segunda parte da explicação 5 e não sejam simples também).
Ok, vamos pensar. Quando estou executando uma ação visando a certo objetivo, elejo os elementos que tratarei como básicos. Isso acontece sempre. Por exemplo, se quero fazer um sistema operacional, posso dizer que a linguagem de programação será meu elemento básico. Se quero fazer um filme, estabeleço que precisarei de um roteiro, atores e uma câmera. Se quero construir um prédio, vou precisar de tijolos, cimento, ferramentas, etc. Enfim, há sempre um mínimo por onde começar, ainda que esse mínimo, em última instância, não seja simples (isto é, indivisível) em sua essência. Mas o que importa é que esses elementos sejam simples para quem executa a ação.
Partindo daí, tenho então minhas unidades simples, meus blocos de trabalho. Se "simples" é o que não é composto, logo, o complexo é o que pode ser desdobrado em partes. Portanto, meu objetivo complexo será composto. Pelo quê? Pelos elementos simples que tenho à mão.
Disso resulta que o desafio de ser simples está não em produzir sempre algo pouco sofisticado e singelo, mas lembrar-se de começar pelas unidades simples, de construir uma base simples. A complexidade vai aparecendo aos poucos, conforme o conjunto é ampliado.
Essa é a maneira mais simples como consigo ver e explicar a questão da simplicidade. Espero que tenha ficado claro. Mas, se ainda estiver complexo, sugiro outra abordagem: pesquise, leia, releia, pense, reflita e tire suas próprias conclusões. Simples assim!