quinta-feira, 17 de setembro de 2009

De dentro pra fora

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Existem pelo menos sete versões para o meu nascimento. Outras quatro estão em andamento e mais duas foram prometidas pelos produtores hollywoodianos.

A mais conhecida delas começa numa viagem. Meu pai vinha do Tabuleiro, norte de Minas, rumo a Foz do Iguaçu, enquanto minha mãe saía de Congonhas rumo a Pernambuco, de onde partiria para Fernando de Noronha. Cruzaram-se em Belo Horizonte, amor à primeira vista, e acabaram ficando por aqui. Jamais conheceram os destinos para onde iam naquela época. O desejo de visitar os dois lugares passaria mais tarde pra mim.

O amor foi à primeira vista, mas o casamento não. O espírito aventureiro estava forte em ambos e, quando se juntaram, obviamente esse espírito não foi anulado, mas multiplicado por dois. E eles descobriram, ainda, que poderiam ser radicais ao quadrado.

Segundo meu pai, a primeira aventura foi um acampamento de dez dias numa reserva florestal perto da cidade. Bom, o planejamento foi de dez dias, mas a excursão acabou durando pelo menos uns dois meses, pois eles se perderam. Meu pai diz que tiveram que usar todas as táticas de sobrevivência que sabiam. Comer frutas silvestres, enfrentar chuva, esquivar de animais peçonhentos... Ele se lembra disso com tanta satisfação que chego a pensar que o fato de ficarem perdidos estava nos planos.

Segundo a minha mãe, entretanto, a primeira aventura foi uma escalada numa das diversas serras que Minas oferece. Escalada para subir, tirolesa para descer. Fizeram isso quatro vezes, até que estavam tão molhados que resolveram mudar o jeito de descer, pra ver se secavam mais rápido. Foram, então, de asa delta.

Meu pai diz que eu fui concebido numa noite na mata. Minha mãe diz que foi numa noite na serra. Eu acho que foi numa noite em que os dois estavam na lua. Lua-de-mel.

De qualquer forma, o que se sabe é que a experiência da asa delta agradou bastante aos dois. E daí para os saltos de paraquedas não custou muito. Fizeram um salto atrás do outro durante meses. Nove meses para ser mais exato. Pularam em diversas cidades diferentes e conheceram boa parte do Estado assim. Quando minha mãe sentiu as contrações ficarem mais fortes, decidiram voltar para a capital.

Estavam no avião quando as pontadas de dor ficaram insuportáveis, sinal de que eu pedia pra sair do útero e me aventurar também por este mundão de Deus. Meu pai suava em bicas. Já tinha passado por muitas coisas radicais na vida, mas nenhuma delas o havia preparado suficientemente para a radicalidade de ser pai. Ainda mais naquelas circunstâncias.

Os próximos acontecimentos sucederam-se muito rápido. O avião cruzou as bordas da cidade. O aeroporto estava a curta distância, mas minha mãe não conseguiria esperar. Havia um hospital no caminho e o avião passaria sobre ele. Meus pais não pensaram duas vezes: colocaram os paraquedas e saltaram.

Acho que comigo aconteceu mais ou menos a mesma coisa. Não pensei duas vezes: saltei para fora da barriga da minha mãe, em pleno ar. Só que sem paraquedas. Não sei qual foi a manobra que eles fizeram para lidar com aquela situação. Só sei que deu certo.

Depois dos cuidados iniciais no hospital, médicos e enfermeiros quiseram saber com detalhes o que tinha acontecido. Meus pais contaram a história, entre exclamações de espanto e salvas de contentamento da pequena platéia de plantão. Mais tarde os parentes também quiseram ouvir o relato, que foi igualmente repetido para os amigos. Cansados de contar toda a história, meus pais decidiram, por fim, simplificar. Perguntados a respeito do caso, diziam apenas: “Como nasceu? De parto anormal!”

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

De fora pra dentro

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Quem sou eu? Tem certeza de que quer saber? A história da minha vida não é para medrosos. Se alguém lhe disse que era uma historinha feliz… se alguém lhe falou que eu era apenas um cara comum, sem importância no mundo… esse alguém mentiu.

Eu não sei voar. Não tenho visão de calor nem visão de raio-x. Não lanço teias nem escalo paredes. Não tenho um traje à prova de balas nem artefatos de última tecnologia. Não fico invisível, não consigo respirar debaixo d'água, não corro à velocidade da luz, não pulo a quilômetros de distância, não sou mais forte do que o normal… Mas eu tenho um poder. Sim, um super poder. O poder de te fazer ir a lugares onde você jamais esteve. Lugares que você nem pensava que existissem. Posso te levar para o meu mundo.

Nesse mundo, nem tudo é o que parece ser. E muito do que parece não ser, de fato é. Lá eu posso ser o que você quiser. Lá eu sou o que eu quiser ser. No meu mundo, ser ou não ser, na verdade, não é a questão.

Quem sou eu? Você quer mesmo saber? Pois bem, então venha comigo. Vamos, não tenha medo. Abra a porta e me acompanhe. Eu vou te mostrar.