domingo, 22 de janeiro de 2023

Lições de renúncia

Imagino como terás sofrido nesse contato direto com a espúrcia humana; entretanto, não sofras por isso. Agradece a Deus o te haver revelado Madame Paulete, tal qual é, antes de assumires qualquer compromisso, pois quando nos comprometemos com o mal, ainda que inocentemente, aliciamos grandes dificuldades por nos libertarmos dos seus odiosos laços. No teu caso, pois, devemos estimar a esmola de uma santa lição. É que, às vezes, naquilo que denominamos maldade e ingratidão do mundo, pode existir um socorro divino em nossa própria defesa.

Estou muito longe de compreender verdadeiramente o Cristo, mas, não obstante, certa de não ter vindo a este mundo para descanso e gozo fictícios. Aliás, nosso raciocínio deve ser claro: se o Salvador veio à Terra provar os testemunhos mais ásperos, vertendo sangue e lágrimas, por que darmos tanta importância a algumas gotas de suor vertidas em benefício próprio?

[Renúncia, segunda parte, cap. II, págs. 233 e 256 - Emmanuel]

sexta-feira, 16 de outubro de 2020

Do sublime

Não é a persuasão, mas a arrebatamento, que os lances geniais conduzem os ouvintes; invariavelmente, o admirável, com seu impacto, supera sempre o que visa a persuadir e agradar; o persuasivo, ordinariamente, depende de nós, ao passo que aqueles lances carreiam um poder, uma força irresistível e subjugam inteiramente o ouvinte. A habilidade da invenção, a ordenação da matéria e sua distribuição, nós a custo as vemos emergir, não de um, nem de dois passos, mas do total da textura do discurso, enquanto o sublime, surgido no momento certo, tudo dispersa como um raio e manifesta, inteira, de um jato, a força do orador.

[Do sublime, cap. I, parágrafo 4 - Longino ou Dionísio]


Aliás, tampouco ignoro que nós, naturalmente olhamos todas as ações humanas antes pelo lado pior e que a lembrança dos erros permanece indelével, enquanto a das belas ações cedo se escoa. Eu mesmo já registrei não poucas falhas de Homero e dos outros maiores escritores; os defeitos não me proporcionaram o mínimo prazer; contudo, não os considero faltas voluntárias de bom gosto, senão lapsos casuais, produto inadvertido de incúria da genialidade; ainda assim, penso, embora as maiores perfeições não mantenham o seu nível em toda parte, devem receber sempre o voto para o primeiro prêmio, se por nenhum outro motivo, pela sua própria elevação.

[Do sublime, cap. XXXIII, parágrafo 3 - Longino ou Dionísio]


É fácil, caríssimo amigo, e próprio do homem sempre dizer mal do seu tempo. Vê lá, no entanto, talvez não seja a paz do mundo habitado o que corrompe as grandes naturezas, senão muito mais essa guerra sem fim que domina os nossos desejos e, por Zeus! além dela, as paixões que assediam a vida atual e a devastam de alto a baixo. O amor das riquezas, com efeito, mal insaciável de que todos hoje padecemos, e o amor dos gozos nos escravizam ou melhor, pode-se dizer, arrastam de corpo e alma a um abismo; o amor do dinheiro é uma doença que empequenece; o dos prazeres, a mais ignóbil de todas. Por mais que reflita, não consigo descobrir como, adorando, ou, para dizer a pura verdade, endeusando uma riqueza ilimitada, seria possível não contrairmos os seus males congênitos, que nos assaltam a alma. Com efeito, unida à riqueza desmedida e desregrada, dizem, uma suntuosidade a acompanha, marcha com ela a passos iguais e, pelas portas que ela vai abrindo, com ela invade as cidades e casas e com ela passa a morar. Conforme os sábios, ambas, com o tempo, nidificam na nossa vida e dispostas à procriação, geram a cobiça, o orgulho, a luxúria; não é uma prole sua espúria, mas sim absolutamente legítima. Se a gente deixa esses rebentos da riqueza atingir a idade adulta, logo dão à luz nas almas a uns tiranos inexoráveis, a insolência, o desregramento, a imprudência. É fatal que assim aconteça, que os homens não mais volvam os olhos para o alto, já não façam conta alguma da sua reputaçãoo, mas nessa evolução se complete aos poucos a ruína de sua vida, se esvaeçam e se estiolem os valores espirituais, sem mais despertar emulações, quando se volte a admiração para as partes mortais e se negligencie o crescimento das imortais. Numa causa justa e bela, já não será juiz livre e são alguém peitado para dar sentença, pois, é inevitável, ao venal só se afigura belo e justo o seu interesse pessoal; quando passam a árbitros da vida inteira de cada um de nós os subornos, a caça à morte de outros homens, as emboscadas aos testamentos; quando cada um de nós, escravo da cupidez, vende a alma para comprar todos os proveitos, acaso, nessa imensa e ruinosa podridão da vida, nos parece restar ainda, livre e incorruptível, um juiz do que é grande e durável pela eternidade, a quem não possa suplantar o desejo de possuir mais? Bem, a indivíduos tais como somos nós, obedecer a um senhor talvez seja melhor do que ser livres, porquanto nossos apetites, inteiramente às soltas, como feras libertadas duma jaula contra as pessoas próximas, alargariam com os seus males o mundo habitado. Em síntese, dizia eu, o que arruína a índole da presente geração é a indiferença em que todos, com poucas exceções, passamos a vida sem nenhum esforço nem iniciativa que não tenha em mira louvores e prazeres, jamais uma utilidade digna de emulação e apreço.

[Do sublime, cap. XLIV, parágrafos 6 a 11 - Longino ou Dionísio]


[Traduções retiradas de "A poética clássica / Aristóteles, Horácio, Longino";
tradução direta do grego e do latim por Jaime Bruna;
12. Ed., São Paulo:Cultrix:2005;
páginas 72, 102, 113 e 114]

sábado, 9 de março de 2019

Desarmamento

Não se pode pensar em desarmar os braços sem desarmar os espíritos.

[Socialismo e Espiritismo, cap. "Jaurés Espiritualista II", pág. 179 - Leon Denis;
tradução e notas de Renato Zanola e Denise Villas Bôas]

domingo, 24 de fevereiro de 2019

Socialismo e Espiritismo

O ódio não pode ser vencido pelo ódio, já dizia a sabedoria antiga; só se poderá vencê-lo com bondade, boa-vontade e tolerância.

É preciso mais tolerância em nossas ações e de forma alguma atirar o anátema àqueles que pensam diferente de nós. Como me agrada reconhecer que dentre nossos contraditores há pessoas de mérito, dignas de consideração e estima.

Um despacho de Londres, datado de 7 de março, nos anuncia que ele [Ramsay Mac. Donald, chefe do partido trabalhista, primeiro-ministro da Grã-Bretanha] falou nos seguintes termos durante a reunião do Conselho Nacional das Igrejas Livres: "Sou daqueles que tem fé no Estado Socialista. Não tenho vergonha nem medo de agir assim. Porém, existem dois socialismos. Um é uma filosofia e um sistema de vida; o outro um meio eleitoral. A ideia de classes é um tóxico para o espírito social."

Segundo os meus precedentes artigos, me qualificaram entre os socialistas. Porém tive o cuidado de dizer que não aceito o Socialismo sem a temperança da doutrina espiritualista que o atenua, retirando-lhe todo o caráter amargo de violência. Reprovo o Socialismo materialista que semeia o ódio entre os homens e que por conseguinte fica infecundo e destrutivo como visto na Rússia. Sou evolucionista e não revolucionário.

[Socialismo e Espiritismo, caps. 3, 4 e 7, págs. 60, 61, 82, 83, 125 e 126 - Leon Denis;
tradução e notas de Renato Zanola e Denise Villas Bôas]

domingo, 27 de janeiro de 2019

Em nossa luta

Não estamos na obra do mundo para aniquilar o que é imperfeito, mas para completar o que se encontra inacabado.

[Vinha de Luz, cap. 32: "Em nossa luta" - Emmanuel]